RÁDIO COXIXOLA WEB

quinta-feira, 29 de setembro de 2016

O povo forjado nos versos: poesia é tradição em São José do Egito

A cidade tem pouco mais de 30 mil habitantes, que carregam a poesia no sobrenome.

O conhecido Louro do Pajeú com sua viola  - Créditos: Paulo Carvalho
O conhecido Louro do Pajeú com sua viola / Paulo Carvalho
"Ser poeta é saber não ser escravo

Da mesmice e do conservadorismo

Impedir de morrer na guilhotina

O boêmio cantor do iluminismo

E lutar até ver cair vencida

A esquadra do vil capitalismo
"

Em Canto e Poesia


Capital nordestina da poesia popular. Não demora para logo pensarmos em São José do Egito, no Sertão do Pajeú. É assim que a cidade é conhecida desde muito tempo. Localizada a 402 km do Recife e com pouco mais de 30 mil habitantes, São José do Egito respira e exala os versos populares. Seus habitantes carregam a poesia como sobrenome e alguns dos seus expoentes são reconhecidos no Brasil todo. Antônio Marinho, Dimas, Otacílio, Lourival Batista, Mário Gomes, Cancão e tantos outros.

A lenda é que há muito tempo uma viola foi enterrada no leito do Rio Pajeú e quem bebe dessa água vira poeta. A história diz que a sonoridade do baião de viola chegou no período da colonização portuguesa e tem influência dos mouros e muçulmanos. A tradição é passada de geração para geração por dentro das famílias, no cotidiano da cidade. Bia Marinho, poetisa e cantadora, neta de Antônio Marinho e filha de Lourival Batista, segue fazendo as rimas. Hoje morando no Recife, faz da sua arte o seu ofício e diz que não tinha como não ser assim. “Nasci na poesia. Para mim, ela existiu sempre. Minha família toda é de poeta. Então a poesia sempre esteve presente. Desde as cantigas de ninar que eu ouvia eram particulares”, conta.

Com os três filhos de Bia Marinho não foi diferente. Greg, Antônio e Miguel Marinho formam o grupo Em Canto e Poesia e mantêm pulsante a poesia popular. Antônio Marinho, assim como a mãe, lembra do seu começo nesse caminho. “Isso é minha vida. Eu já nasci inserido num meio da poesia tanto pela cidade quanto pela minha família. A poesia é meu meio de vida. Tudo que andei foi a poesia me levando, no lastro de resistência construído pelos que me antecederam. Nessa perseguição do belo. O sotaque, o cheiro, a cor do Sertão do Pajeú é que faz dessa poesia particular”, explica Antônio.

Bia explica que a cidade toda cultiva essa tradição. “Todas as famílias têm um poeta. E mesmo que não tenha alguém que escreva, tem alguém que declama ou está envolvido de alguma forma. Em algumas escolas particulares e da rede municipal, a poesia está inserida no contexto escolar. As crianças aprendem o que é a sextilha e a quadra. É um linguajar fácil e atrativo para elas. E essa tradição não vai morrer. A gente cuida de preservar”, explica a cantadora.

O poder público municipal, no entanto, não tem projetos estruturados de fomento e manutenção dessa arte, como explica Antônio: “Nunca tivemos uma política pública voltada para criar uma cadeia e fomentar a tradição. E, mesmo assim, a tradição continua forte. Toda força disso é mérito do povo. Não houve nenhuma gestão municipal que fomentasse uma cadeia produtora e criativa, na qual os protagonistas fossem os artistas. O poder público municipal sempre negligenciou a poesia”.

Apesar desse contexto, festas populares são realizadas para reverenciar a poesia nordestina. A festa mais tradicional é que acontece nos dias 4, 5 e 6 de janeiro. “A Festa de Louro, como é conhecida, é para comemorar o aniversário de Lourival Batista. Sempre comemorávamos na frente de casa e a festa foi crescendo. Como cai em outra data importante, o Dia de Reis, aproveitamos e fazemos uma grande festa com cantoria e muita história. Vem poeta e cantador do Brasil inteiro para recitar e comer o Baião de Dois, que é o prato servido na festa”, afirma Bia.

POR: BRASIL DE FATO - Elen Carvalho - Recife/PE, https://www.brasildefato.com.br/2016/09/24/o-povo-forjado-nos-versos-poesia-e-tradicao-em-sao-jose-do-egito/

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Este comentário será analisado e publicado, mas se vier causar dano ou calunia a outro ou não for conveniente com nossa política de comentários ele será esquecido. Pedimos que não falte com respeito as pessoas lembradas nesta matéria, nem com outras que poventura não estejam aqui inclusas, se utiliza da ética, moral e verdade. A responsabilidade deste comentário é totalmente sua.